Gestão de dados em clubes: como times latinos saíram da crise financeira com tecnologia

Nos últimos anos, clubes da América Latina têm intensificado o uso de análise de dados em busca de eficiência. Em webinar recente da StatsBomb, representantes do Atlético Mineiro, Internacional e Red Bull Bragantino destacaram que “os dados desempenham papel fundamental” em suas operações. A análise ajudou, por exemplo, o Atlético Mineiro a conquistar o primeiro título nacional em 50 anos e levou o Bragantino à Libertadores. Isso ilustra como estratégias orientadas por dados têm sido encaradas como parte da “revolução” no futebol latino-americano.

Ao mesmo tempo, muitos clubes enfrentam crises financeiras graves: no Brasil, por exemplo, os 20 clubes da Série A tinham cerca de R$ 11,7 bilhões em dívidas acumuladas recentemente. Para reverter o quadro, vários investiram no modelo de clube-empresa (SAF) e em tecnologias de gestão. A lei que criou a SAF (Lei 14.193/2021) estimula a migração dos clubes-­sociais a estruturas empresariais, impondo normas de governança e financiamento mais rígidas. Em suma, a combinação de profissionalização administrativa e uso de tecnologia e dados é vista como a chave para recuperar a viabilidade esportiva e financeira desses times.

Desempenho esportivo orientado por dados

A análise de dados entrou em campo para otimizar o rendimento esportivo. Hoje clubes utilizam sensores e algoritmos de inteligência artificial para otimizar cada movimento em campo, prever lesões e identificar talentos (o que não seria possível apenas por observação tradicional). Por exemplo, o próprio Atlético Mineiro – que já enfrentava sérios problemas financeiros – montou equipe de analytics para aprimorar contratações e treinos, e em 2024 reportou receita de R$ 419 milhões enquanto a dívida líquida caiu R$ 747 milhões. Essa gestão data-driven no futebol do Galo se refletiu em títulos e receitas maiores. O Internacional, outro dos times mencionados no painel da StatsBomb, também incorporou ciência de dados ao futebol para guiar táticas e reduzir o desperdício de recursos.

Marketing digital e engajamento de torcedores

No âmbito comercial, a gestão de dados redefine o relacionamento com os torcedores. Os clubes latino-americanos somavam cerca de 310 milhões de fãs em redes sociais e geravam 3,1 bilhões de interações anuais antes de 2022. Só o Flamengo lidera esse ranking com 670 milhões de interações ao ano. Esse enorme alcance digital passa a ser monitorado e monetizado via patrocínios e conteúdo personalizado. Segundo especialistas, o futebol brasileiro tem se profissionalizado, valorizando suas marcas e atraindo receitas maiores. A reestruturação das equipes de marketing e das áreas comerciais foi determinante para transformar essa base de fãs em receita estável.

Alguns clubes foram ainda mais além. O Chivas (Guadalajara, México) é citado como caso disruptivo: a diretoria construiu um modelo de marketing centrado em análise de mercado e big data. Em 2019, executivos destacaram que o Chivas criou uma identidade de marca (“essência Chivas”) apoiada em dados sobre torcedores, tornando-se o clube mexicano mais popular nos EUA (mais de 8 milhões de fãs). O clube aplica big data para segmentar campanhas e engajar o torcedor antes, durante e depois dos jogos. Essa abordagem data-driven de branding e fan engagement contrasta com o marketing tradicional de muitos rivais, permitindo ao Chivas (e a outros clubes similares) reverter crises de imagem e aumentar receitas de sócio-torcedor, bilheteria e marketing.

Gestão financeira e tecnologia

Além de futebol e marketing, a gestão administrativa baseada em dados e tecnologia tem sido crucial. Sistemas integrados (ERP) e ferramentas modernas garantem controle em tempo real sobre finanças e contratos. Por exemplo, o Botafogo (RJ) – recém-convertido em SAF – implementou o sistema SAP Business One para obter “uma gestão ainda mais eficiente” de recursos e contratos. Em paralelo, recursos de inteligência artificial e até blockchain são usados para automatizar orçamentos, compras e fluxo de caixa, aumentando transparência e segurança das informações.

Entre as principais iniciativas adotadas por clubes endividados, destacam-se:

  • Tecnologia de gestão integrada: uso de ERPs, CRMs e softwares de análise financeira para consolidar dados de receita e despesa em tempo real.
  • Ferramentas emergentes: aplicação de inteligência artificial e blockchain para automatizar processos e proteger dados sensíveis, apoiando decisões estratégicas nos departamentos financeiro e comercial.
  • Migração ao modelo SAF: vários clubes venderam parte do capital a investidores, adotando a Sociedade Anônima do Futebol para atrair aportes e renegociar dívidas. Por exemplo, o Atlético Mineiro tornou-se SAF em 2023 e obteve aporte de sócios e fundos, reduzindo R$ 747 milhões de passivos.

Essas ações combinam insights de dados internos (desde projeções de receita até análise de comportamento de sócios-torcedores) com governança profissional. O efeito prático é uma disciplina financeira que antes faltava: permite recuar gastos excessivos e priorizar investimentos de maior retorno.

Conclusão

Os exemplos acima mostram que a gestão estratégica de dados pode ser o divisor de águas para clubes latinos em crise. Integração de analytics no futebol, gestão digital de fãs e sistemas corporativos reforçam cada área vital: desde o campo até o balanço financeiro. Como observa Bruno Brum (CMO esportivo), o produto futebol ganhou apelo global com profissionalização e fortalecendo marcas, o que naturalmente atraiu mais patrocinadores. Em síntese, clubes que passam a operar como empresas de tecnologia – usando big data, BI, inteligência artificial e governança robusta – encontram meios de recuperar credibilidade e saúde financeira. Em um esporte onde o êxito no campo e a fidelização do torcedor andam juntas, a gestão orientada por dados mostra-se cada vez mais essencial para levar qualquer clube latino-americano “de volta à vitória”, dentro e fora das quatro linhas.

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